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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Pecuaristas buscam modelo para a garantia ambiental da carne

Fazendas do Norte do Mato Grosso são alvo dos primeiros testes de campo para o início da certificação socioambiental da carne no país, destinada à comprovação da origem sem impactos à floresta e às condições trabalhistas e sociais. O projeto, iniciado em abril, envolve o sistema de normas recém-aprovado mundialmente pela Rede de Agricultura Sustentável (RAS), inaugurando na pecuária o modelo de práticas sustentáveis aplicado com resultados positivos em diversas culturas agrícolas. "O propósito atual é criar referências para a expansão do selo na cadeia produtiva até as gôndolas dos supermercados", revela Maurício Voivodic, secretário-executivo do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), organização brasileira que articulou a elaboração das normas hoje válidas internacionalmente.

"Os frigoríficos estão sendo pressionados por ambientalistas, Ministério Público, bancos e redes varejistas para a garantia da carne produzida sem destruição da floresta ou trabalho escravo, mas falta um mecanismo de comprovação que tenha independência e credibilidade", justifica Voivodic. Após Mato Grosso, o novo sistema será calibrado em fazendas do Pará e Acre.

Sem a existência de um instrumento de mercado capaz de diferenciar quem produz com critérios ambientais e sociais, atualmente a distinção entre bons e maus empreendedores acontece mediante investigações e listas negras do Ministério Público. Neste mês, a Procuradoria da República no Acre entrou com ação civil pública contra 14 frigoríficos e o Ibama, visando o pagamento de R$ 2 bilhões em multas e a proibição do comércio de carne oriunda de áreas embargadas em razão de desmatamento ilegal ou de trabalho escravo no Estado. A ação foi empreendida após tentativas frustradas de um acordo para assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta por frigoríficos flagrados nas investigações comprando carne de fazendas irregulares.

"Aconteceu algum problema de informação e estamos prontos para assinar o compromisso", afirma Marcus Vinicius Pratini de Morais, diretor do comitê de sustentabilidade do Grupo JBS-Friboi. Ele esclarece que a empresa participa de diferentes pactos com o MP, apoia práticas sustentáveis no campo e mantém um sistema próprio para controlar a rastreabilidade da carne e impedir negócios com propriedades ilegais. "No entanto, por conta das grandes distâncias e do tamanho das fazendas, o monitoramento eletrônico apresenta falhas que estão sendo resolvidas", admite o executivo.

Para Pratini de Morais, "requisitos socioambientais, principalmente por parte do mercado europeu, é mais uma barreira comercial para a carne brasileira". O Grupo JBS é o maior produtor mundial de carne, abatendo no Brasil 34 mil cabeças de gado, além de deter um terço do mercado americano. "Por conta de medidas restritivas, as vendas para Europa caíram de R$ 1,5 bilhão para R$ 300 milhões", lamenta o executivo.

No programa Carne Legal, o Ministério Público Federal no Pará proíbe a comercialização de carne de propriedades que desmatam. Cerca de 80 empresas já assinaram o compromisso de negociar apenas com proprietários rurais que tenham pedido o licenciamento ambiental ou cujas fazendas estejam localizadas em municípios que participam do acordo contra o desmatamento. Até o momento, 78 prefeituras endossaram o pacto. Antes da iniciativa, havia apenas 900 propriedades inscritas no cadastro ambiental rural, necessário para a licença. Em abril, o número atingiu 52,1 mil.

O prazo para regularização ambiental é 30 de agosto para as fazendas de grande porte.

"É um erro responder à questão com listas de exclusão", afirma Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra Amazônia Brasileira, organização não governamental que apoia práticas sustentáveis na região. Ele defende políticas de compra responsável e ações pro-ativas das empresas de efeito permanente. A certificação socioambiental, em sua opinião, não é uma panaceia, mas contribui para a construção de uma base de fornecedores. "Mesmo em pequena escala no início, o selo é uma medida que apontará tendências no mercado e promoverá a organização de cadeias hoje desarticuladas, a da carne, couro e laticínios", analisa Smeraldi.

"A certificação é apenas uma etapa, o fim da linha", explica Márcio Astrini, do Greenpeace. "A distância entre o mundo real da Amazônia e o da certificação é muito grande", alega o ambientalista, explicando que as soluções atuais devem acontecer "em nível mais baixo", uma vez que metade das áreas com registro de trabalho escravo no país corresponde à pecuária. Além disso, cerca de 80% das áreas desmatadas na Amazônia são ocupadas por gado, de acordo com Plano Interministerial de Prevenção e Combate ao Desmatamento.

Valor Econômico
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