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sábado, 24 de dezembro de 2011

Bactérias no intestino estão ligadas à obesidade e diabetes

Flora intestinal

Pesquisadores da Unicamp estão apontando para as bactérias presentes no intestino humano como uma nova linha de investigação sobre obesidade e diabetes.

Em 2006, um estudo publicado na revista Nature mostrou que obesos e magros tinham um tipo diferente de flora intestinal.

Há três anos, o grupo brasileiro começou a investigar o mecanismo pelo qual uma mudança na flora intestinal poderia ter influência na obesidade e na resistência à insulina.

Receptores tipo Toll

Dois dos candidatos para mediar os efeitos da flora intestinal no metabolismo são os receptores TLR2 e TLR4, proteínas codificadas por um gene da família chamada de tipo Toll (receptores similares ao Toll), um trabalho premiado com o prêmio Nobel de Medicina deste ano.

O TLR2, uma proteína receptora presente na membrana de determinadas células, desempenha um papel no sistema imunológico.

Ele reconhece antígenos e transmite "sinais" para as células do sistema imunológico.

O TLR4 também é um receptor do sistema imunológico. Ele detecta principalmente lipopolissacarídeos (LPS), componentes presentes na parede celular das bactérias gram-negativas existentes no intestino.

"O animal obeso tem o receptor TLR4 ativado. A primeira coisa que encontramos nesse animal foi um LPS elevado. O LPS elevado aumenta absorção de energia que se acumula em forma de gordura. Fomos então procurar de onde vinha esse LPS elevado e os candidatos diretos foram as bactérias do trato gastrointestinal", explica o orientador das pesquisas, Dr. Mario José Abdalla Saad.

Inflamação crônica

Os vários estudos que levaram a esta conclusão, todos publicados em revistas internacionais, tornaram cada vez mais evidente que a resistência à insulina, induzida pela obesidade, está associada com uma inflamação crônica do tecido adiposo, músculos esqueléticos e órgãos internos como o fígado.

Os estudos mais recentes do grupo mostram que uma mutação no receptor TLR4 tem um papel central na ligação entre a resistência à insulina, inflamação e obesidade.

As concentrações de LPS aumentam significativamente após a ingestão de refeições de alto teor de gordura e carboidratos. A ingestão de gordura leva ao aumento da permeabilidade intestinal, porque o LPS é solúvel em gordura.

Segundo o pesquisador Alexandre Gabarra Oliveira, enquanto o índice de LPS circulante no obeso equivale a 0,5 EU/ml, no magro, esse valor é de 0,05 EU/ml.

Bactérias no intestino

Existem aproximadamente 100 trilhões de bactérias no intestino, representando de 400 a 1.000 espécies.

O conjunto de bactérias que habitam o trato gastrointestinal é chamado de microbiota.

Essas bactérias possuem a capacidade de extrair mais ou menos energia dos alimentos. Elas possuem enzimas capazes de digerir carboidratos complexos - polissacarídeos - transformando-os em carboidratos mais simples que são absorvidos e utilizados ou armazenados pelo organismo.

A partir da hipótese que a flora intestinal do obeso e do magro é diferente, tanto em humanos como em roedores, o biomédico Bruno de Melo Carvalho buscou uma forma para modular a flora intestinal e comprovar a relação desta com a resistência à insulina e com a obesidade. A estratégia foi usar antibióticos.

O grupo de animais sem os antibióticos adquiriu todos os componentes de resistência à insulina induzidos por obesidade - inflamação, intolerância à glicose e perda de sensibilidade à insulina.

"O animal tratado com antibiótico teve todos os componentes fisiológicos melhorados em relação ao animal que apenas recebeu dieta rica em gordura. Tanto no fígado, músculo e tecido adiposo, a ativação de todas as proteínas das vias de sinalização da insulina foi melhorada em relação aos animais que não foram tratados", disse Bruno.

Com o tratamento com antibióticos, o pesquisador conseguiu reduzir o número de bactérias no intestino e essa queda proporcionou uma redução dos níveis de LPS circulante, o que resultou na ativação menor do TLR4 e redução na inflamação desse animal, ocasionando melhora na sensibilidade à insulina.

Microbiota

A pesquisa da bióloga Andrea Mora Caricilli foi a peça que faltava para entender a relação entre a flora intestinal e a obesidade.

Ela utilizou um grupo de camundongos modificados geneticamente para a não expressão do receptor TLR2, chamados nocaute.

Estudos publicados anteriormente por outros pesquisadores apontam que a ausência do TLR2 leva a um aumento da sensibilidade à insulina.

Entretanto, ao contrário do que mostram esses estudos, não foi isto que ela encontrou.

"Percebemos que o camundongo nocaute tinha um aumento da concentração de lipopolissacarídeo em comparação aos animais controle. Esse aumento nos levou a investigar qual era a composição da flora intestinal. Observamos que a flora intestinal desses animais tinha uma maior proporção de Firmicutes, como se observa nos obesos", explicou Andrea.

De acordo com a pesquisa, as mudanças na microbiota intestinal foram acompanhadas por um aumento na absorção de LPS, inflamação subclínica, resistência à insulina, intolerância à glicose e, mais tarde, obesidade.

Para comprovar essa teoria, Andrea tratou os camundongos nocaute para o TLR2 com antibióticos de largo espectro, o que dizimou a microbiota intestinal e resgatou o fenótipo metabólico do animal, assemelhando-se ao que se observa nos camundongos controle.

Em seguida, transplantou a microbiota dos camundongos nocaute para o TLR2 para camundongos controles com uma microbiota bastante simplifica e passou a alimentá-los com ração padrão. Os animais começaram a desenvolver obesidade e resistência à insulina.

Conclusões

"Toda regulação do sistema imunológico na flora intestinal, o crescimento e predominância de um tipo de bactéria dependem do alimento que você consome e do ambiente em que você está inserido.

"Dependendo da flora intestinal estabelecida no seu organismo, haverá uma menor ou maior absorção de gordura e uma maior ou menor propensão ao desenvolvimento da inflamação subclínica e da resistência à insulina. Ainda não está esclarecido como ocorre a seleção bacteriana no intestino", concluiu a pesquisadora.

"A obesidade tem um componente genético e ambiental, mas a flora intestinal é mais importante do que pensávamos.

"Se eu pegar uma flora intestinal de um animal obeso e transplantar para um animal magro, esse animal é capaz de desenvolver obesidade. Uma dieta calórica com alto teor de gordura e pouca fibra modula as bactérias da flora intestinal e facilita a instalação da obesidade," concluiu Saad.

Com informações do Jornal da Unicamp

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