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quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A pegada do consumo

Descobrir o tamanho do impacto que a humanidade causa no planeta é o objetivo do cálculo da pegada ecológica. Quando, em 1972, o mundo se reuniu pela primeira vez, em Estocolmo, na Suécia, para debater a degradação que a humanidade vinha causando no meio ambiente, não era possível ainda mensurar o tamanho real destes impactos. Desde então, a ciência optou por ir além do que os olhos podem enxergar e estudos e pesquisas traduziram em números a marca que os atuais mais de sete bilhões de habitantes estão deixando na Terra. As constatações da ciência, quanto às mudanças climáticas, escassez de recursos, desmatamento e muitos outros pontos, fizeram crescer a conscientização da população mundial. Mas, mesmo assim, muitas pessoas não conseguem ainda compreender qual o papel de cada um nisso tudo. Para facilitar a missão de descrever o impacto gerado, foi criado o conceito da pegada ecológica. Segundo o Dicionário Aurélio, pegada significa “conjunto de marcas deixadas pela passagem de algo ou alguém”. Descobrir o tamanho destas marcas é o que este conceito faz. Para isso, é analisado o estilo de vida de uma única pessoa ou de um grupo, organizado, por exemplo, em cidades. Segundo a organização não governamental WWF Brasil, que já realizou o cálculo da pegada de cidades como São Paulo (SP) e Campo Grande (MT), são considerados os hábitos de consumo diários e então é estimada a área produtiva, seja de terra ou de mar, necessária para gerar produtos, bens e serviços que sustentam a pessoa. No caso de um grupo, são considerados os hábitos médios de consumo da população. Entram na contabilidade basicamente: a terra bioprodutiva, que é aquela utilizada para colheita, pastoreio, corte de madeira e outras atividades de grande impacto; o mar bioprodutivo, que é a área necessária para pesca e extrativismo; a terra de energia, que é a quantidade de florestas e mar necessária para a absorção de emissões de carbono; a terra construída, que se refere à área utilizada para casas, construções, estradas e infraestrutura; e a terra de biodiversidade, que são as áreas de terra e água destinadas à preservação da biodiversidade. No cálculo da capital paulista, a conclusão apontou que os 11 milhões de moradores da cidade consomem em média 2,5 vezes o que o planeta é capaz de regenerar. Isto representa uma pegada individual de 4,38 hectares. “A análise é que, se cada pessoa no mundo consumisse como os moradores de São Paulo consomem, seriam necessários 2,5 planetas para sustentar o estilo de vida”, explicou o engenheiro ambiental e coordenador do WWF Brasil, Michael Becker. Na cidade de Campo Grande o resultado foi de 3,14 hectares por pessoa, o que equivale a 1,7 planetas. Segundo um estudo realizado pela Global Footprint Network (GFN), rede mundial responsável pelos cálculos da pegada ecológica, a pegada média mundial em 2007 era de 2,7 hectares globais por pessoa, enquanto a biocapacidade disponível para cada ser humano é de apenas 1,8 hectares globais. Este resultado representa uma demanda por recursos naturais 50% maior do que o planeta é capaz de suprir. Nos cálculos da entidade, se a escalada dessa demanda continuar no mesmo ritmo, em 2030, com uma população planetária estimada em 8,3 bilhões de pessoas, serão necessárias duas Terras. Para Michael Becker, a grande vantagem desta visualização numérica dos impactos é a possibilidade de que, a partir destes diagnósticos, políticas públicas sejam desenvolvidas. “Saber a pegada ecológica é um primeiro passo. Por exemplo, em Campo Grande, depois que calculamos a pegada, foi implantado um comitê, com representantes de várias entidades, para desenvolver programas de mitigação dos impactos. A pegada ajuda a saber de onde vem o maior impacto, o que facilita as medidas de mitigação”, disse o coordenador do WWF Brasil. Em uma alusão à medida do Produto Interno Bruto (PIB), Michael lembra que, mesmo com um valor atribuído à pegada, ainda existe alguma dificuldade por parte da população para compreender a sua participação. “A pegada é como o PIB. O trabalhador no dia a dia, no seu trabalho, nas suas compras, não consegue sentir a influência que ele está exercendo no crescimento do PIB. É um indicador macroeconômico clássico que diz se a economia está indo bem ou mal. A pegada é mais ou menos por aí. Ela aponta a direção dos impactos da economia sobre os recursos naturais. Se estamos consumindo a mais ou a menos. A partir desta informação, é preciso repensar os hábitos de consumo. Ela tem que ser vista como um indicador para o planejamento.” É possível realizar o cálculo da pegada individual de cada pessoa na internet, em sistemas eletrônicos gratuitos. Porém, para Michael, sem um trabalho de conscientização, esses números não surtem o efeito desejado. “A maioria das pessoas não absorve a informação. Por isto acredito que as políticas públicas são o caminho. Além de poder atuar com medidas de incentivo, o governo pode fazer campanhas de conscientização. As pessoas quando vêm a carne na prateleira do supermercado, precisam saber que não estão consumindo apenas a carne, mas todos os recursos naturais que foram necessários para que ela chegasse até a prateleira.” Sobre os padrões atuais de consumo da humanidade, ele alerta: “se continuar como está, não vai sobrar planeta para as gerações futuras”. (Envolverde) (Agência Envolverde)

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