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domingo, 6 de julho de 2014

Calendário de vacinação contra gripe pode estar errado

Estudos vêm mostrando que países com grande extensão latitudinal, como o Brasil, precisam adotar políticas distintas de vacinação contra a gripe. O alerta foi feito por Nancy Cox, diretora do Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, em editorial publicado no Boletim da Organização Mundial de Saúde (OMS). A recomendação é que, conforme a distância do Equador, adote-se um calendário recomendado para o hemisfério Sul e outro recomendado para o hemisfério Norte. Hoje, a recomendação da OMS é para que países situados no hemisfério Sul vacinem suas populações entre os meses de abril e maio, enquanto no hemisfério Norte a imunização costuma ser indicada entre setembro e dezembro. Essa inadequação dos calendários poderia eventualmente explicar o crescente desinteresse da população pela vacina contra a gripe. Estação da gripe Na hora de formular a vacina, é feita uma previsão das cepas de influenza que estarão circulando nos meses de inverno com base em dados coletados por uma rede internacional de vigilância epidemiológica coordenada pela OMS. "Em todos os países de clima temperado, há um pico sazonal na atividade do vírus influenza bem definido nos meses de inverno. No entanto, em países de clima tropical e subtropical, a sazonalidade do influenza é mais variável e sua atividade pode ser observada ao longo de todo o ano - sendo frequentemente mais intensa nos períodos chuvosos", escreveu Cox. A cientista do CDC comentou os resultados de um estudo realizado em dez países asiáticos - todos situados no hemisfério Norte - entre 2006 e 2011. Dois padrões distintos ficaram evidentes. Na Indonésia, Malásia e em Cingapura, países próximos à linha do Equador, não era possível perceber um pico bem definido na atividade viral. Já nas outras sete nações - situadas mais ao norte, mas ainda na região tropical - foi visto um pico de atividade mais claro entre os meses de julho e outubro, período das chuvas de monções (e verão no hemisfério Norte). "Esse pico contrasta com o pico de inverno típico da sazonalidade do influenza verificada nas regiões de clima temperado do hemisfério Norte. Uma mesma relação entre latitude e período de pico de influenza foi verificada no Brasil," escreveu Cox, referindo-se a dados do primeiro artigo a levantar a questão, publicado em 2009 por cientistas brasileiros. Caso do Brasil De acordo com Wladimir Alonso, um dos autores do estudo, mesmo antes de 2009 já existia entre especialistas a suspeita de que a sazonalidade do vírus seria diferente em regiões tropicais. "Nós fizemos o primeiro artigo quantitativo sobre o tema", contou. O grupo brasileiro reuniu amostras de pacientes infectados pelo influenza coletadas no Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, e no Instituto Evandro Chagas, no Pará, entre 1999 e 2007. Foram então comparadas as cepas encontradas nas amostras com as cepas que fizeram parte da formulação da vacina do hemisfério Sul no ano correspondente. Segundo o pesquisador, esse primeiro estudo mostrou uma concordância maior com a vacina do hemisfério Norte tanto nas amostras coletadas no Pará quanto nas amostras da região Sudeste. "No entanto, estudos mais recentes em colaboração com a Fiocruz (RJ) têm revelado que nas regiões Sul e Sudeste do Brasil a recomendação feita para o hemisfério Sul é de fato a mais adequada. Já no Norte e em parte do Nordeste, com exceção da Bahia, seria melhor seguir o calendário e a formulação recomendada para o hemisfério Norte, pois são locais onde não há um inverno bem definido e a dinâmica de circulação de vírus obedece a outras condições climáticas ainda não bem compreendidas", disse Alonso, que também participou de um estudo que verificou uma situação semelhante na China. Circulação do influenza De acordo com a pesquisadora Terezinha Maria de Paiva, do Instituto Adolfo Lutz, está sendo feito atualmente um mapeamento para entender a dinâmica de circulação do influenza no Centro-Oeste do Brasil. "Já recebemos amostras de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Piauí, Tocantins e Rondônia. A princípio, os dados parecem ser compatíveis com os observados nas Regiões Sul e Sudeste", disse Terezinha, que também participou do estudo pioneiro da equipe brasileira. Segundo todos os pesquisadores, já há evidências suficientes para mudar a estratégia de vacinação em diversos países situados em regiões tropicais e equatoriais, inclusive o Brasil. "Penso ser realmente importante que as pessoas que conhecem esses dados consigam sensibilizar os tomadores de decisão de seus países. No caso da Índia, por exemplo, o período de vacinação já foi mudado," disse Cox. Agência Fapesp

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