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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Se colocássemos o gene FOXP2 em chimpanzés eles poderiam aprender a falar

O gene da fala foi nomeado assim antes dos cientistas entenderem o que ele realmente fazia. Agora, camundongos que receberam a versão humana do gene FOXP2 estão finalmente conseguindo esclarecer algumas questões sobre a forma como essa capacidade de se comunicar através da fala evoluiu nos primeiros seres humanos. Os ratos que receberam o tal gene parecem aprender mais facilmente tarefas inconscientes – algo que se assemelha ao que fazemos quando aprendemos uma nova rota para o trabalho, por exemplo. Os pesquisadores afirmam que este trabalho sugere que o gene FOXP2 poderia nos ajudar a aprender a falar quando crianças, pois nos daria o controle inconsciente sobre nossos lábios e língua. O FOXP2 é o gene mais profundamente estudado, justamente porque os pesquisadores suspeitam que ele pode ter desempenhado um papel crucial na evolução do cérebro humano. Ele foi descoberto na década de 1990 em uma família britânica conhecida como KE, onde alguns parentes têm dificuldades graves de fala causadas por uma mutação nesse gene. O FOXP2 foi apontado como uma espécie de codificador, algo como um “fator de transcrição”, uma proteína que regula a atividade de outros genes e é ativa no cérebro durante o desenvolvimento embrionário. Então se colocarmos esse gene FOXP2 em chimpanzés… Comparações entre os genomas de humanos e chimpanzés revelaram que desde que nos separamos dos chimpanzés houve duas mutações históricas fundamentais neste gene. Os pesquisadores acreditam que essas mutações deram uma mãozinha (e tanto) para o desenvolvimento das nossas capacidades vocais superiores. A grande questão é o que aconteceria se a versão humana desse gene fosse colocada em chimpanzés. Será que isso iria melhorar suas habilidades vocais, por exemplo? Será que eles aprenderiam a falar como nós? Nós talvez nunca saibamos a resposta para essa questão porque, como você já deve ter se questionado a essa altura da leitura, questões éticas impedem que esse tipo de pesquisa seja levada a diante. Até porque ninguém quer viver no Planeta dos Macacos, caso alguma mutação não planejada aconteça. No entanto, a versão humana do gene foi colocada em alguns ratinhos, como já dissemos no início. E o que os pesquisadores puderam observar foi que ele altera o cérebro de várias maneiras sutis, especialmente nos circuitos neurais envolvidos na aprendizagem. Até agora, porém, ainda não está claro quais os efeitos que isso teve sobre o comportamento ou a inteligência dos animais. Para descobrir, Ann Graybiel e seus colegas, ambos do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (EUA), testaram os ratos usando uma cruz ou labirinto em forma de “T” que, em um determinado ponto do circuito, continha uma recompensa alimentar. O pensamento consciente O labirinto podia ser alterado para testar ambos os processos de aprendizagem, tanto inconscientes quanto conscientes. Às vezes a comida era colocada de modo que os animais sempre tinham de virar na mesma direção para encontrá-la, o que foi pensado para envolver a aprendizagem automática. Em outras ocasiões, a comida foi posta em diferentes braços do labirinto, mas com pistas visuais para mostrar onde estava escondida e como chegar lá. Uma espécie de charada que, pelo menos em humanos, requer processos de pensamento conscientes. De acordo com um dos pesquisadores envolvidos no estudo, foi uma boa maneira de diferenciar o teste entre estes dois modos de aprendizagem (consciente e inconsciente). Resultados Os ratos que receberam uma versão humana do gene FOXP2 aprenderam a encontrar a comida mais rápido do que os ratos normais – levaram oito dias em comparação com 12 dias dos ratos “normais” – quando o labirinto estava montado para que eles pudessem usar os dois processos de aprendizagem, arbitrariamente. Não foi observada diferença na taxa de aprendizagem quando os ratos tiveram de usar qualquer uma das estratégias separadas. Segundo Ann Graybiel, essa configuração é exatamente o que acontece quando os seres humanos aprendem uma nova rota para o trabalho: primeiro vamos nos guiando por sinais visuais, e depois que nos acostumamos é quase como se nossos pés conhecessem o caminho – a rota se torna automática. Os resultados sugerem que os camundongos FOXP2 eram melhores em aprender a transferir um comportamento do consciente para o controle automático, completa Graybiel. Boca automática Então, como isso tudo se relaciona com a evolução da linguagem? Segundo Graybiel, o discurso é muitas vezes visto como uma habilidade que exige um salto na capacidade de processamento de pensamento consciente, mas também é dependente de movimentos mais complexos dos lábios e da língua até que se torne automático. O gene FOXP2 poderia ter ajudado essa transição, quando os primeiros seres humanos ganharam a incrível habilidade de falar. Se isso for verdade, o gene também teria um papel fundamental quando as crianças estão aprendendo a falar. Faraneh Vargha-Khadem, da Universidade de Londres, adverte, porém, que o gene FOXP2 opera em muitas partes do cérebro e por isso essa constatação pode não necessariamente explicar seu papel na evolução do discurso. De qualquer maneira, as experiências com camundongos estão começando a provocar uma separação entre diferentes tipos de processos de aprendizado que são afetados pela versão humana do FOXP2, diz Dianne Newbury, da Universidade de Oxford, o que nos leva a concluir que, de um jeito ou de outro, essa é uma parte muito importante do quebra-cabeça. [newscientist]

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